Posterizamos na base: a história de Greg


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Quando é o auge da vida? Tem gente que fala que a sabedoria na velhice é a resposta para todas as dúvidas da mente, e eu até votaria nisso mas não cheguei lá pra saber de fato… Também tem um galera que julga as possibilidades da juventude como o melhor momento humano, e eu como jovem consigo ver porque isso faz sentido. Mas verdadeiramente, eu acho que depende do sonho de cada um e cravo que não tem regra pra sonhar direito. Ta! Mas e quando você não sabe que já tá vivendo o seu sonho? E quando o seu sonho tá rolando ao vivo e a sua realidade momentânea já é o auge da sua vida sendo que você nem percebeu? E como que esse parágrafo filosófico faz sentido em uma coluna que fala de basquete de base? Bom, eu não sei se ele faz, mas eu sei que esse dilema é quase essencial pra o cálculo estequiométrico que produz o basquete de base e seus heróis.

Decidi que o personagem dessa história “meramente ilustrativa” se chama Gregório como alusão ao tadinho Greg Oden (vítima do auge que passou voando) e também como garantia de que ninguém ache que escrevi sobre alguém de verdade. Até porque, essa história é baseada em algumas dezenas de histórias reais que serão misturadas para formação do mundinho de Gregório, o atleta da base brasileira.

Então vamos lá!

Gregório é craque. Essa premissa é importante, porque sem seu talento, Gregório já teria sido expulso algumas vezes dos clubes pelo seu comportamento, ou falta de, que escancara a inocência desse jovem. Desde muito cedo, Greg (como seus companheiros de time o chamam por motivos óbvios de ter um dos nomes mais ambíguos da base) se destacou e recebeu todo carinho que uma promessa do basquete nacional pode receber. Chegou até a ganhar mixtape no Posterizamos. Mas no fundo, Greg joga porque sempre jogou e nunca foi atrás de mais nada porque seu futuro tá escrito desde o primeiro dia que arremessou uma bola: Greg nasceu pra jogar basquete.

Gregório é assumidamente folgado. Essa característica é sintoma de muita coisa que Greg ainda nem tem maturidade pra associar. Desde sempre, Greg escolheu a carapuça de Romário e só treina pra não tomar bronca de quem pode dar bronca… Aliás, hoje em dia nem isso mais garante Greg nos treinos. Pra ele, treinar é perda de tempo exatamente porque “seu futuro tá escrito” e “Greg nasceu pra jogar basquete.”

Nesse ano, ele venceu tudo que jogou e até pegou Seleção. Viajou pra fora, realizou o sonho de muita gente, mas jogou menos do que costuma jogar no clube porque escolheu o videogame às oito horas de sono e chegou cansado pra alguns treinos. Mas o que importa, é que Greg vestiu a amarelinha e foi pra fora do Brasil. Pra Greg, vencer faz parte e perder mais ainda, até porque esses resultados no Sub-17 pouco importam pro futuro de um menino que “nasceu pra jogar basquete.”

Greg fechou o ano com destaques individuais; mixtapes no instagram; fãs novos; e status de estrela por ser craque. Perdeu nas semis do estadual, mas até ficou feliz, porque pra ele o basquete é chato! Aí mora mais um traço da personalidade de Gregório: ele joga basquete porque é a única coisa que sempre fez. Greg tem medo de falhar porque desde cedo só acertou dentro de quadra, e quando errou, pelo menos deixou algumas enterradas na cabeça de algum menino que sonha em jogar basquete mas que não nasceu pra ser jogador que nem Greg.

Greg odeia o basquete. Ele não sabe, mas é refém desse jogo. Como pode uma brincadeira de criança tirar toda graça da vida de uma criança que sempre foi a melhor nessa brincadeira? Paradoxal, né?

Quando era mais novo, Greg levava a sério porque queria mostrar pra todo mundo que aquilo não era um passatempo, era o futuro dele: Greg seria jogador de basquete. Depois de um tempo, todo mundo já sabia que esse era o seu caminho e a bola laranja ficou sem graça, até porque, agora todo mundo levava a sério, e Greg, que nunca tinha brincado direito de jogar bola, sentia que precisava achar graça de algum jeito. Hoje, Greg brinca com o sonho de todos que dividem a quadra com ele, exatamente porque perdeu a sua época de brincadeira.

Além do basquete, odeia que todo mundo ama aquilo e odeia que tem gente que treina pra vencer o Greg. Odeia que mesmo fazendo trinta pontos por jogos, tem que ouvir de um velho que se ele não acordar pra vida vai acabar deixando o sonho na base!

“Mas que sonho?” Greg não sonha em jogar basquete. Como ele pode sonhar com alguma coisa que já vai acontecer? Pra que gastar tempo sonhando com isso? Não tem motivos para que Greg passe horas se dedicando por algo que ele já naturalmente faz melhor do que todo mundo desde sempre.

Greg não sabe, mas ele não odeia o basquete. Greg ama isso tudo, mas no fim das contas, odeia mesmo o seu talento. Greg odeia que seu futuro tá traçado desde sempre e odeia que nunca tentou nada porque descobriu muito cedo o destaque que tanta gente passa a vida atrás. Greg é medroso e só não sabe da sua situação porque escolhe não pensar tão a fundo e desencadear alguma crise evitável.

Vira o ano e Greg completa 18 anos de idade, tá na hora de virar. Mas Greg não quer. E será que ele pode não querer? Quem vai permitir o multicampeão da base; maior promessa de todos os clubes que passou; ainda em ano de Seleção da sua geração, deixar o basquete de lado? Ameaçam ele com o papo de que: “ele não pode deixar o ápice da vida dele ser um recorde de pontos em um jogo do Sub-16 uns anos atrás”. Greg é refém do seu talento e nunca foi atrás de nada porque seu futuro já tava escrito… Greg ia ser jogador de basquete.

Será que o auge da vida de Greg já passou? Será que ainda não chegou? E se ainda não aconteceu, vai ser dentro de quadra né?

Gregório não sabe fazer nada além de bater bola. É um coitado que nunca brincou, venceu mas não se convenceu, abdicou tanto do seu futuro que virou fantoche da opinião externa. Pelos meus cálculos, Greg ainda não chegou no auge da sua vida. Não sonhou o suficiente pra isso e muito menos almejou coisas pra um dia conquistar.

Greg sempre achou que sua vida era um sonho. Muita gente disse que sonhava em ser que nem ele em algum dia… Mas quem escolheria ser Greg por um dia se soubesse que nem ele sabe o que é. É um craque dentro do seu maior pesadelo. Um menino que nunca sonhou.

Greg quer fugir! Quer parar por um tempo e deixar tudo de lado! Mas como ele faria isso? Greg é o prodígio brasileiro; é referência de muitos; vive o sonho de tantos; garante o trabalho de alguns técnicos; demite outros e ainda assim não é Gregório. É o Greg que pintaram pra ele mesmo. Sem personalidade por ter sido escolhido pelos deuses da bola laranja desde sempre… Ah, mas podem ficar tranquilos, por bem ou por mal, seu futuro já tava escrito e agora não tem mais como… Greg vai ter que ser jogador de basquete.

Fonte: Arthur Salazar

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